STF nega decisão de cobrança de imposto de renda sobre adiantamento de herança
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STF nega decisão de cobrança de imposto de renda sobre adiantamento de herança
24 out 2024•Última atualização: 24 outubro 2024
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, na sessão da última terça-feira (22), um recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que pretendia cobrar Imposto de Renda (IR) sobre as doações de bens e direitos, em valor de mercado, feitas por um contribuinte a seus filhos, em adiantamento de herança.
A questão foi discutida no Recurso Extraordinário (RE) 1439539, apresentado contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que negou a incidência do IR no caso.
"Em voto apresentado em sessão virtual, o ministro Flávio Dino (relator) observou que a decisão do TRF-4 é compatível com a jurisprudência do STF pacificada no sentido de que o fato gerador do IR é o acréscimo patrimonial efetivo", explicou o STF por meio de nota à imprensa.
O relator destacou que as regras constitucionais visam impedir que um mesmo fato gerador seja tributado mais de uma vez.
"No caso em questão, a incidência do IR acabaria por acarretar indevida bitributação, pois já há a cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD)", acrescentou o STF em seu comunicado.
Entenda o caso
Em suma, a PGFN argumentava que, ao doar bens ou direitos aos filhos, o contribuinte poderia ser tributado sobre o aumento de valor desses bens.
Por exemplo, se alguém comprou um imóvel por R$ 100 mil e, no momento da doação, esse imóvel passou a valer R$ 300 mil, a Receita Federal pretendia cobrar o Imposto de Renda sobre essa diferença de R$ 200 mil, considerando isso um "ganho".
Essa tentativa visava tributar o que, em tese, seria o aumento do patrimônio ao longo do tempo. Mesmo que o doador não tenha recebido dinheiro ou qualquer benefício direto com essa valorização.
Assim, a PGFN baseava esse entendimento na ideia de que esse aumento de valor representaria um acréscimo patrimonial.
Julgamento pelo STF
No caso analisado, o contribuinte havia doado bens a seus filhos como antecipação de herança, e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) já havia decidido que o Imposto de Renda não se aplicava. A PGFN recorreu ao STF, buscando reverter essa decisão e permitir a cobrança.
O ministro Flávio Dino, relator do processo no STF, argumentou que o fato gerador do Imposto de Renda é o aumento real do patrimônio. Ou seja, o acréscimo financeiro que traz mais riqueza ao contribuinte.
Como a doação diminui o patrimônio do doador, ele não fica mais rico; na verdade, empobrece, ainda que indiretamente. Assim, não haveria justificativa para a cobrança do IR.
Além disso, o relator ressaltou que já existe um imposto específico para doações e heranças, o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). Se o IR fosse cobrado, isso geraria bitributação — a cobrança de dois impostos sobre o mesmo fato, o que a Constituição não permite.
Histórico da cobrança
A tentativa de cobrar Imposto de Renda sobre doações em adiantamento de herança não é recente. Nos últimos anos, a Receita Federal passou a adotar uma interpretação mais agressiva, entendendo que o ganho de valor dos bens entre a data de compra e a doação deveria ser tributado.
Essa prática de cobrança ocorreu com mais frequência entre 2019 e 2022. Mas havia discussões sobre a aplicação desde antes, embora o foco da Receita tenha se intensificado nos últimos cinco anos.
Portanto, as pessoas que fizeram doações nesse período podem ter sido expostas à cobrança do Imposto de Renda sobre doações. Mesmo quando o entendimento não era claro ou consolidado.
Casos anteriores
Em alguns casos, a Receita Federal chegou a cobrar o Imposto de Renda sobre doações de bens com valorização ao longo do tempo. Isso aconteceu porque o entendimento sobre esse tipo de tributação ainda estava em debate.
Contribuintes que realizaram doações de bens valorizados foram surpreendidos com a exigência de pagar IR sobre o aumento de valor dos bens.
No entanto, com a decisão do STF, esses casos agora têm um novo desfecho. Os contribuintes que pagaram o Imposto de Renda sobre essas doações poderão buscar a restituição do valor pago indevidamente.
O processo para isso envolve entrar com um pedido administrativo junto à Receita Federal ou, se necessário, buscar o Judiciário para garantir a devolução.
Como solicitar a devolução do imposto pago?
Se um contribuinte pagou o Imposto de Renda sobre doações em antecipação de herança, ele pode entrar com um pedido de restituição junto à Receita Federal.
Esse pedido deve ser feito dentro do prazo de 5 anos a partir da data de pagamento do imposto. Para isso, o contribuinte precisa apresentar os comprovantes de pagamento e explicar que a cobrança foi indevida, com base na decisão do STF.
Caso a Receita não aceite o pedido ou demore a processá-lo, o contribuinte pode recorrer à Justiça para garantir o direito de receber o valor de volta.
A decisão do STF fortalece a posição do contribuinte nesses casos, tornando mais provável a restituição dos valores pagos.
Novo caminho para os contribuintes
A decisão do STF de impedir a cobrança de Imposto de Renda sobre doações de bens como antecipação de herança abre um novo caminho para os contribuintes.
Com essa definição clara, quem deseja doar bens ou antecipar a herança para seus filhos pode fazer isso de forma mais segura, sem a preocupação de pagar impostos indevidos.
Além disso, quem foi afetado por essa prática no passado tem a oportunidade de buscar a devolução do valor pago, corrigindo uma injustiça tributária que se consolidou nos últimos anos.
Essa decisão marca um passo importante na proteção dos direitos dos contribuintes e na clareza das regras fiscais que envolvem doações e herança.
João Cosme Souza e Silva Pereira
Sócio da Blue3 Investimentos e Especialista em Proteção Financeira e Planejamento Sucessório.
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